Mês da Mulher – Uma longínqua busca pela igualdade

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Posicionamento da Fundação para o Desenvolvimento da Comunidade (FDC)

“O tempo é agora: activistas rurais e urbanas transformam a vida das mulheres”.

Este é o lema deste ano anunciado pela ONU Mulher para o dia 08 de Março, Dia Internacional da Mulher. Na verdade, o sentido do lema enquadra-se perfeitamente nos esforços empreendidos pela FDC ao longo dos seus 24 anos de existência e na luta contra a injustiça social e desigualdade de género, reforçando sempre o papel das mulheres e jovens.

Neste mês das mulheres, a FDC congratula-se pelos progressos alcançados na realização e observância dos direitos das mulheres em Moçambique. Embora reconhecendo que, por exemplo, a igualdade de género não acontecerá de um dia para o outro, a boa notícia é que, em quase todos Países, as mulheres têm conseguido ganhos positivos dia após dia. Estes ganhos, associados com a emergência vertiginosa de movimentos activos em advocacia e activismo pelo feminismo, vêm alicerçando esses ganhos e sentido de justiça na luta pela emancipação total e completa da mulher.

O facto de existir actualmente 17 mulheres Chefes de Estado – quase o dobro do que existia em 1990, é um ganho. Segundo a UNESCO, o número de países onde as raparigas enfrentam graves desigualdades de gênero – definido como tendo menos de três raparigas na escola primária por cada dez petizes – caiu de 33 países em 1999 para 17 em 2010.

Embora a comunidade internacional e organizações nacionais congratulem-se e comemorem esses ganhos para mulheres e raparigas, Moçambique precisa fazer muito mais para garantir a igualdade de género e de oportunidades entre homens e mulheres, meta que havia sido definida no quadro dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODMs) e que actualmente se afigura como um desafio a ter em conta na prossecução dos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável.

Apesar da crescente participação das mulheres em órgãos decisórios, como na Assembleia da República que actualmente é representada por 35{1a4e51e2a19926db2eaab1bcf154673d0b74297663ea632f824f7b556dd28b8e} das mulheres do universo dos deputados, os direitos humanos das mulheres ainda não são respeitados e assegurados na sua plenitude. Assistimos ainda casos de abusos e violência física ou sexual, muitas vezes repetidamente e perpetrados por parentes ou pessoas conhecidas pelas vítimas.

No meio a este mar de desafios, alguns estudos sobre a mulher no país lançam luz para que, enquanto sociedade civil, continuemos a fortalecer as sinergias para soluções colaborativas. Exemplo disso é o estudo sobre a participação económica e produtiva das mulheres nas áreas rurais, que indica que cerca de 83{1a4e51e2a19926db2eaab1bcf154673d0b74297663ea632f824f7b556dd28b8e} da mão de obra da agricultura familiar é composta por mulheres.

Não obstante, a FDC reconhecer os esforços do Governo para melhorar as condições das mulheres jovens e crianças, principalmente na criação da Estratégia Nacional de Prevenção e Combate aos Casamentos Prematuros, muito ainda há por realizar. Por exemplo, a taxa de mortalidade infantil em Moçambique é uma das mais altas do mundo, que concorre para que muitos petizes morram ainda no útero todos os anos.

De todos os desafios que as mulheres e as raparigas enfrentam, para algumas, não ter voz é mais intolerável. Heroínas anónimas e conhecidas lutam para ser livres e para fazer ouvir suas vozes, ainda que sofram perseguições e sevicias de diferentes formas. Em muitos casos, pela sua determinação e firmeza, estas heroínas garantem maior participação das outras mulheres silenciadas nas diferentes frentes de luta em Moçambique.

Neste mês das mulheres, celebremos os triunfos das mulheres, mas também mantenhamos bem claro o que se apresenta como desafios com vista a reverter a realidade em que tantas mulheres ainda vivem.

Num contexto em que mais da metade da população moçambicana vive abaixo da linha da pobreza, sendo o rosto desta pobreza predominante o das mulheres, urge arregaçar as mangas e colocar no topo das nossas prioridades o empoderamento das mulheres em todas as esferas de desenvolvimento humano. O empoderamento das mulheres, torna-se assim, um imperativo nacional, um desiderato incontornável na prossecução dos objectivos de desenvolvimento sustentável no contexto de Moçambique.

Esta visão colocará Moçambique na rota da redução de mais uma diferença de género – a de limitar a reprodução da desigualdade entre as gerações – permitindo que rapazes e raparigas examinem a construção de identidades e normas sociais de género, as estruturas subjacentes que perpetuam a desigualdade e desaprovem as ideologias estereotipadas de género.

Fazer da educação de género um assunto curricular tornará o problema ainda mais “oficial” e legítimo e criará uma geração consciente das normas de género mais igualitárias. Um esforço concertado seria exigido pela sociedade civil para influenciar políticas a nível nacional nesta direcção, com a visão futura de desconstruir a injustiça social que leva a pobreza a ter rosto feminino em Moçambique, situação imposta historicamente em virtude da tendência continua de perpetuidade das desigualdades de oportunidades.

A nossa experiência revela-nos que as mulheres precisam de ter os homens como aliados. A educação, a saúde e a segurança das mulheres não são problemas gerados unicamente pelas próprias mulheres. Os homens devem estar envolvidos em discussões sérias sobre a construção social da masculinidade e da feminilidade em seus contextos com as implicações resultantes para a igualdade de género.

Precisamos de campeões masculinos em todas as áreas: política, negócios, sociedade civil, nos lares e nas escolas. Todos nós podemos ganhar com esta inclusão.

Com incontáveis desafios na área social e económica, fomentado pelos altos índices de casamentos prematuros que limita os direitos das raparigas como o da educação e empoderamento financeiro, em virtude da baixa literacia e contração de doenças infecciosas, as mulheres necessitam do apoio incondicional dos homens na construção de novas narrativas para edificação de sociedades saudáveis.

Na área económica, por exemplo, a questão fundamental é a inclusão económica, os direitos de uso e aproveitamento de terra, igualdade de oportunidades em todas as esferas sociais, económicas e políticas, particularmente em foros participativos e de tomada de decisão. Estas acções requerem decisões arrojadas por quem de direito e que incluem acções concretas como a alocação de recursos nas áreas prioritárias e a desagregação do orçamento por género.

É neste quadro que a FDC coligada nas diferentes plataformas como CECAP, MEPT, FMO, apoiada pela extensa rede de activistas sociais ao nível rural e urbano, reitera a validade e pertinência da sua missão de fortalecer as capacidades das comunidades para vencer a pobreza e promover a justiça social.

Para FDC, o mês da mulher constitui mais uma oportunidade para refletirmos até que ponto estamos ou não a vencer em relação aos direitos da mulher. Achamos inquestionável se valeu a pena a luta iniciada a 8 de Março de 1857 e, por isso impõe-se que sejam colocados na mira os novos desafios globais de intensificação de sinergias entre organizações da sociedade civil e os Governos para concretização do ideal de protecção dos direitos da mulher e a promoção da sua participação nas diferentes frentes que compõem as novas narrativas de desenvolvimento, urgindo desta forma a necessidade de:

Paz e reconciliação Nacional

É um imperativo garantirmos a inclusão das mulheres e os seus diversos movimentos sociais no processo de reconciliação da paz e coesão social, criando espaços de participação a todos níveis, mais sobretudo no nível de influência do actual consenso alcançado entre o Governo e a Renamo; Manutenção das boas práticas resultantes da descentralização por via das autarquias que oferecem espaços impares de exercício de direitos democráticos e de cidadania.

Ao nível do plano e orçamento do Estado:

Aumentar a alocação de recursos para as áreas prioritárias como Educação, Saúde, Habitação, Apoio legal e Psicossocial, Água e Saneamento e Nutrição, destacando-se a desagregação por género destes recursos e a sua descentralização para os níveis mais próximos das mulheres.

Casamentos Prematuros

Aceleração do processo de aprovação do Ante-projecto de Lei contra “Casamentos, Uniões e Noivados Prematuros’’, dando primazia a criminalização dos perpetradores de tais práticas nocivas ao pleno desenvolvimento das adolescentes, raparigas e mulheres jovens.

Inclusão económica e financeira

Aposta na abordagem multissectorial, aumentando acesso às oportunidades de educação, formação técnico profissional, garantia do acesso, uso e aproveitamento de terra, inclusão nos fóruns de decisão e concessão de créditos bonificados.

Como seu contributo para a realização destes ideais, a FDC tem se esforçado na mobilização de recursos, como por exemplo, para prevenção e combate do HIV/SIDA, no âmbito do apoio conseguido pelo Fundo Global que nos próximos três anos permitirá a redução das taxas de seroprevalência nas raparigas e mulheres jovens dentro e fora da escola a nível do país.

A assistência técnica ao Governo Moçambicano no contexto do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, CONSAN, visando a redução das actuais taxas de subnutrição para 20{1a4e51e2a19926db2eaab1bcf154673d0b74297663ea632f824f7b556dd28b8e} até 2020; associado a isso, a FDC tem estado intensivamente envolvida, a nível nacional, na promoção de educação nutricional e no aproveitamento de produtos locais para elevar o valor nutricional das refeições nas comunidades;

Criação de oportunidades para a elevação de habilidades para a vida e mobilidade económica e social das raparigas, através do Centro de Formação Profissional que até ao presente colocou no emprego formal e auto-emprego mais de 200 mulheres jovens.

Distribuição de cerca de 3 milhões de redes mosquiteiras só no ano passado, o que permitiu principalmente aos grupos vulneráveis, como mulheres grávidas e crianças evitassem a contração da doença mais mortíferas do País, a malária.

Empoderamento da Rapariga e sua sensibilização visando a redução de taxas de casamentos prematuros e gravidezes precoce, evidenciado por varias acções como transformação das raparigas em activistas comunitários e inclusão das mulheres no centro de formação profissional.

Engajamento de mais de 600 mulheres no movimento emergente de activistas para paz e reconciliação nacional visando sua participação e influência na construção da agenda nacional da paz, reconciliação e coesão social, para além da garantia de acções de protecção social para mais de 50,000 crianças órfãs e vulneráveis que, gradualmente vão acedendo a serviços prioritários como educação, saúde, apoio legal e psico-social, habitação, alimentação e fortalecimento económico.