MINEDH vai melhorar instrumentos normativos que protejam os direitos das alunas

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A Ministra da Educação e Desenvolvimento Humano, Conceita Sortane, assumiu recentemente, num encontro com as organizações da sociedade civil (FDC, ROSC, CESC e MPET), o compromisso de reformular o despacho 39/2003, que obriga as meninas grávidas a serem transferidas para o curso noturno e falha no dever de protecção da rapariga.

MINEDH assume o compromisso de melhorar instrumentos normativos que protejam os direitos das alunas

‘’ O Governo não pode deixar a decisão sobre o que fazer com as meninas grávidas na escola ao critério das escolas ou dos Conselhos de Escola ou ainda dos Encarregados de Educação, mas sim, deve dar orientação ou seja o comando sobre o que se deve fazer”, lê-se no documento de fundamentação das OSCs para revogação do despacho.

As organizações  acima apontam para a flagrante exclusão das raparigas na escola e discriminação face a gravidez de que elas são vítimas, como de assédio, violência sexual e falta de informação e de preparação para tomar decisões sobre a sua vida sexual e o seu próprio corpo.

Estes aspectos, lembra-se, são em grande parte responsabilidade da própria escola, pois não só não há uma atitude enérgica contra o pessoal que agride sexualmente as alunas, como também não há programas que permitem acompanhar e apoiar as raparigas no seu desenvolvimento integral.

Durante o encontro havido este mês, a Ministra Conceita Sortane reconheceu que o Decreto em alusão deve ser revogado com a maior urgência possível e afirmou que o seu Ministério irá trabalhar com todo vigor no assunto, até porque a segurança da rapariga na escola é um dos principais desafios com que o seu pelouro se depara neste momento.

Porém, esta é uma questão que, segundo a Ministra, não se esgota apenas nos esforços e medidas que o MINEDH deve tomar, sendo importante por isso uma abordagem multissectorial na prevenção e combate contra todas as formas de violência contra a rapariga.

MINEDH assume o compromisso de melhorar instrumentos normativos que protejam os direitos das alunas

‘’Assumimos o compromisso de dialogar com a Ministra da Saúde para a criação de dispositivos normativos de articulação eficiente com o MISAU e MJD, que garantam a provisão permanente de pacote de serviços integrados de informação, insumos, testagem regular e capacitação permanente dos Professores, Conselheiros de Saúde e Psicólogos, bem como inclusão de conteúdos sobre Direitos e Saúde Sexual e Reprodutiva – DSSR nos currículos a nível das escolas, para a tomada de decisão segura e informada contra HIV, ITS, Casamentos Prematutos e Gravidezes Precoces’’, acrescentou a Ministra.

Constituiu também pontos de avaliação a Inclusão das Mulheres na Educação de Adultos; Ensino pré-escolar; Questões ligadas a Saúde Sexual e Reprodutiva nas Escolas; Prevenção de Casamentos Prematuros, entre outros.

A estratégia e foco de intervenção das OSC vai continuar centrado na escola como pilar e na comunidade como guardião e percursor dos valores e boas práticas de desenvolvimento, através de diálogos comunitários permanentes e em coordenação com o MINEDH para a melhoria da qualidade e acesso universal de educação para todos, num ambiente livre de HIV ITS, Gravidezes Precoces e Casamentos Prematuros.

Contexto

Fundamentação legal da Sociedade Civil (WLSA)

O Despacho nº 39/GM/2003 constitui uma discriminação das raparigas na escola e falha no dever de protecção que é devido às crianças

Ao tratar de maneira diferente as raparigas e os rapazes, o Despacho nº 39 viola directamente a Constituição da República no Artigo 36, sobre o Princípio da Igualdade do Género, e que estabelece que “O homem e a mulher são iguais perante a lei em todos os domínios da vida política, económica, social e cultural”.

Este princípio da igualdade e da não discriminação, vem também expresso na Lei nº 7/2008, de 9 de Julho de 2008 (Lei de Promoção e Protecção dos Direitos da Criança), no seu Artigo 4, sobre os Direitos Fundamentais, alínea 2), que refere: “A criança não pode ser discriminada, nomeadamente em razão da cor, raça, sexo, religião, etnia, origem de nascimento, condição socioeconómica, estado de saúde e deficiência”.

O mesmo normativo está contido na Carta Africana dos Direitos e do Bem-Estar da Criança bem como na Convenção Internacional dos Direitos das Crianças.

A Constituição garante ainda, no Artigo 47, sobre Direitos da criança, o dever de protecção e de zelar pelo seu bem-estar, firmando o princípio do interesse superior da criança. Na alínea 3) deste artigo, é instituído que: “Todos os actos relativos às crianças, quer praticados por entidades públicas,
quer por instituições privadas, têm principalmente em conta o interesse superior
da criança”.

É importante considerar que a aplicação do Despacho nº 39 pode constituir, para além de uma forma de discriminação, também uma opressão em relação às raparigas, o que é prevenido pela Lei de Promoção e Protecção dos Direitos da Criança, no seu Artigo 6, sobre Proibição de tratamento negligente, discriminatório, violento e cruel: “Nenhuma criança pode ser sujeita a tratamento negligente, discriminatório, violento e cruel, nem ser objecto de qualquer forma de exploração ou opressão, sendo punidos por lei todos os actos que se traduzam em violação dos princípios ora estabelecidos”.

O Despacho nº 39 viola o direito de acesso à educação por parte das raparigas grávidas

A transferência para o curso nocturno das alunas grávidas, preconizada pelo Despacho nº 39, não tem garantido a permanência destas nas escolas, contribuindo para o abandono escolar. Como já apresentado em documentos anteriores, há escolas que não dispõem de aulas à noite e que não cumprem com a orientação de manter as adolescentes grávidas no turno de dia, e em outros casos não existem condições de segurança para que as mesmas frequentem o curso nocturno.

Ora, o direito à educação é claramente estabelecido nas nossas leis, desde a Constituição (Artigo 88, Direito à educação), à Lei de Promoção e Protecção dos Direitos da Criança (Artigo 38, Direito à educação), e à Carta Africana dos Direitos e do Bem-Estar da Criança (Artigo 11, Educação).

O Despacho nº 39 ignora o princípio do “interesse superior da criança”

Ao longo dos anos em que se tem debatido o Despacho nº 39, surge como um forte argumento para a sua manutenção, questões de ordem religiosa, cultural e moral, deixando de lado os interesses e as necessidades das crianças.

A este respeito, a Carta Africana dos Direitos e do Bem-Estar da Criança é bastante explícita nos seus Artigos 1 e 4, que passamos a citar:

Artigo 1: Obrigação dos Estados Partes

(…)

  1. “Qualquer costume, tradição, cultural ou religiosa, prática que é incompatível com os direitos, deveres e obrigações contidas na presente Carta e ao seu alcance deve ser desencorajado”.

Artigo 4: Melhor Interesse da Criança

  1. “Em todas as acções relativas à criança realizadas por qualquer pessoa ou autoridade, os melhores interesses da criança será a consideração primordial.
  2. Em todos os processos judiciais ou administrativos afectando uma criança que é capaz de comunicar os seus próprios pontos de vista, oportunidades devem ser dadas para os pontos de vista da criança a ser ouvida, quer directamente quer através de um representante imparcial como parte no processo, e as opiniões serão levadas em consideração pela autoridade competente, em conformidade com as disposições da legislação apropriada”.